sexta-feira, 3 de julho de 2009

Cinemascópio: Ciclo Reposições ao Ar-Livre- Hoje, 6ªf, 03 Julho: I’m Not There, de Todd Haynes



Ciclo Reposições ao Ar-Livre


SESSÃO DE SEXTA-FEIRA 03 Julho.2009 - 21H45

A Cadeira de Van Gogh - Associação Cultural

Rua de Morgado de Mateus, nº41
4000-334 Porto

(TOQUEM À CAMPAINHA, PF)

ENTRADA LIVRE

Não Estou Aí
I’m Not There

Realizador: Todd Haynes
Com: Cate Blanchett, Ben Whishaw, Christian Bale, Richard Gere, Heath Ledger, Marcus Carl Franklin
Duração: 135 minutos, COR
Classificação: M/12
Género: Drama, Biografia, Musical
País de Origem: EUA, Alemanha
Ano: 2007

SINOPSE

“Uma viagem pouco convencional à vida e aos tempos de Bob Dylan. Seis actores interpretam o papel de Dylan, como uma série de personagens em mutação – do público ao privado, passando pelo fantasioso – tecendo no seu conjunto um retrato rico e colorido deste sempre esquivo ícone americano. Poeta, profeta, fora-da-lei, falso, estrela eléctrica, mártir do rock’n’roll, Cristão-Novo – sete identidades cruzadas, sete órgãos a alimentar a história de uma vida, tão densa e vibrante como a era que a inspirou.”

http://cinema.sapo.pt/filme/im-not-there

“Se cada pessoa é um mundo, há pessoas que conseguiram que, no espaço de uma vida, coubessem vários mundos. Bob Dylan é uma dessas pessoas. O homem pareceu constantemente escapar às ideias que sobre ele se edificaram, como se houvessem sucessivas máscaras que fosse colocando no rosto - e sempre escondendo o verdadeiro Dylan, que, para começar, nem sequer se chama Dylan, mas Robert Allen Zimmerman... Eu sei, tenho estado por cá desde os tempos em que ele anunciava que os tempos estavam a mudar - e, muito jovem, deixei-me possuir pela voz roufenha e pela harmónica que traçava rasgos no meu peito como um escalpelo que me induzia a procurar cá dentro a minha própria verdade. Tenho estado por cá e não conheço ninguém que não goste de canções de Bob Dylan, nem ninguém que não se tenha afastado da sua música num ponto qualquer do caminho; alguns gritaram «traição!» e voltaram anos depois, outros foram e vieram, outros chegaram tarde - Dylan não tem fiéis.
O homem que nos induziu à verdade, que foi o profeta de toda uma geração, é tão «fake» como uma moeda de três euros? Este filme de Todd Haynes não ajuda à resposta, mas constrói-se, caleidoscópio, jogo de espelhos, como hipótese tangencial a várias dimensões de Dylan. Para tanto, esfacelou-o em seis diferentes personagens (e outros tantos intérpretes), em diferentes idades e fases da sua vida, às vezes procurando uma proximidade icónica - de que o exemplo acabado é a mimética e extraordinária prestação de Cate Blanchett -, outras vezes buscando algo de puramente simbólico. O resultado não é um «biopic», já que não há uma narrativa com sequência clara, são clarões, visões transfiguradas de um mito, pontuadas, em contínuo, pelas canções do trovador. E como Todd Haynes é um cinéfilo, um homem que pratica cinema referenciado, os amantes de cinema podem dedicar-se a decifrar a sinalética que, de Lester a Peckinpah, de Pennebaker a Fellini, por ali abunda.
Não tenho a certeza que alguém que ignore tudo de Dylan consiga orientar-se no dédalo - tanto mais que o seu nome jamais é pronunciado no filme, apenas o genérico nos indica ser a fita «inspirada pela vida e obra de Bob Dylan». Mas as canções estão lá, uma massa que tudo varre como um vento empolgante que não deixa margem para dúvidas. Seria, aliás, curioso poder fazer um esquiço do retrato mental que dele constrói alguém que parta dylaniamente virgem para I’m Not There - Não Estou Aí. Não sei mesmo se ali haverá suficiente informação, de tal modo o filme passa e repassa um tecido cultural e histórico bem delimitado (por exemplo: alguém consegue entender que o primeiro Dylan seja um miúdo negro vagabundo e se chame Woody, ignorando quem foi Woody Guthrie, a sua música, o seu percurso e a influência que Bob Dylan nele foi beber?). Para os outros, todavia, para aqueles que (como o autor destas linhas) tiveram nele uma referência, I’m Not There - Não Estou Aí é um extenso prazer, na descoberta das consonâncias, nas bizarrias desconcertantes com que nos surpreende (caso da sequência com Richard Gere, porventura pouco digerível), na escolha de canções (Haynes pode ter muitos defeitos, nenhum deles é uma tendência para o básico), na deriva de corpos (com uns sentimo-nos à vontade, é ele, com outros resistimos), na interrogação dos restantes comparsas. Mas, sobretudo, o prazer de perseguirmos uma personalidade e só encontrarmos reflexos - talvez Bob Dylan não exista deveras, apenas uma lenda, uma saga, como as dos heróis gregos. Cúmulo dos cúmulos: quando, no termo do filme, o verdadeiro Dylan aparece, finalmente, no ecrã, permanece o efeito de estranheza, como se aquele corpo fosse, afinal, apenas mais um a acrescentar à galeria que desfilara à nossa frente durante mais de duas horas. Não devemos espantar-nos: afinal, desde o título que Todd Haynes nos informara que ele não estaria lá. A verdade sobre um ser humano é uma impossibilidade? Talvez a verdade sobre Dylan, a única que seriamente importa, seja a da música e dos poemas, a das canções, e essa é-nos dada em estado puro. O resto são epifenómenos, a transitoriedade humana.
I’m Not There - Não Estou Aí é uma experiência visual e sonora singularíssima, uma aventura pelo terreno dos significados e dos materiais cinematográficos como poucas vezes experimentamos. Convido-vos a embarcar no navio: a viagem pode não ser esclarecedora, mas é apaixonante.”

Jorge Leitão Ramos
In ACTUAL Expresso, 29 Mar’08, http://www.cineclubeguimaraes.org/filme.php?id=2626

“Bob Dylan é um mito da música popular americana. Apesar de o conhecer desde sempre, confesso que apenas comecei a ouvir a sua música com maior atenção há pouco mais de quatro ou cinco anos. Fiquei imediatamente apaixonado pela sonoridade e, principalmente, pelas letras das músicas, que mais pareciam obras poéticas, com fortes mensagens de protesto. Dylan escreve como poucos no mundo da música. Temas como filosofia, politica e principalmente consciência social, são recorrentes nas letras das suas músicas. Outra característica bem conhecida de Dylan, é o facto de ter passado por fases bastante distintas ao longo da sua vida, sendo que, em cada uma dessas fases, a sua forma de ser e agir mudava tanto que por vezes nem parecia ser a mesma pessoa.

A inconstância existencial de Dylan talvez seja a razão pela qual o realizador Todd Haynes resolveu ter uma abordagem totalmente diferente do que estamos habituados nos “biopics” que temos visto nos últimos tempos. Seis actores foram escolhidos para interpretar personagens que representam Dylan, mas que nem sequer têm o seu nome. Esta escolha, apesar de arriscada, foi a mais acertada pois seria complicado, a apenas um actor, retratar alguém tão complexo e mutável. Ben Whishaw, Christian Bale, Richard Gere, Marcus Carl Franklin, Heath Ledger e Cate Blanchett foram os actores escolhidos para representar as várias fases (ou personalidades) de Dylan. Os segmentos, de cada uma destas personagens, não são contados em separado, as histórias vão-se cruzando e sendo contadas alternadamente ao longo do filme. Esta foi uma opção que, na minha opinião, foi muito bem pensada e conseguida, pois reflecte que as fases, pelas quais Dylan passou ao longo da sua vida, também não foram blocos isolados e separados no tempo.

Sendo este um filme biográfico de um cantor, era inevitável que a música desempenhasse um papel fundamental no filme, sendo, em certas partes, quase que um protagonista do mesmo. Grande parte dos êxitos, que fizeram de Dylan o mito que é, estão aqui presentes. Músicas como "Like a Rolling Stone", "The Times They Are A-Changin'”, "Just like a Woman" e “I'm Not There" são reproduzidas no filme, umas vezes na voz de Dylan, outras nos actores que o interpretam. A ligação entre imagem, música e os diálogos é por vezes tão perfeita e poética que é impossível não nos sentirmos deslumbrados com o que se vai passando diante dos nossos olhos.

Não é de admirar que Todd Haynes tenha obtido o consentimento de Dylan (muitos já tinha tentado obter essa aprovação, mas a resposta foi sempre negativa) para fazer um filme sobre ele. Dylan deve ter visto em Haynes a pessoa ideal para fazer jus à sua vida. Todd Haynes faz um trabalho irrepreensível a todos os níveis. Desde o argumento inovador, escrito pelo próprio, passando pela escolha dos actores e a cinematografia (que alterna entre o preto e branco e a cor), tudo parece estar reunido de forma perfeita.

Com tantos protagonistas, é difícil escolher um nome que se destaque dos restantes. Talvez Cate Blanchett, por ser uma mulher num papel de um homem, e por ser (incrivelmente) a que dá vida à personagem mais parecida, em termos físicos, com Dylan. Este é um elenco repleto de estrelas e de bons actores, sendo que é de destacar que até as personagens mais secundárias (neste caso todos os “não-Dylan”) estiveram muito bem.

Este é um filme enigmático, complexo e poético, tal como a figura que representa. A forma como a história de Dylan é contada é pouca ortodoxa, intensa e bastante alucinante, quase como se de uma letra de uma das suas músicas se tratasse. É, em suma, um filme refrescante, que traz uma lufada de ar fresco ao género, devendo ser visto por quem gosta, ou quer conhecer, Bob Dylan, mas principalmente pela originalidade que apresenta.”

9/10
Luís Costa, www.redcarpe.coresp.com


Uma iniciativa: Pintar o 7 - Cinema, Cidade, Cultura

Apoio: A Cadeira de Van Gogh - Associação Cultural

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